É apresentado hoje o Manifesto do movimento que dá ampla expressão, na Madeira, à Plataforma NÃO OBRIGADA, que visa sensibilizar os cidadãos em geral para votarem NÃO no referendo à despenalização do aborto, a 11 de Fevereiro.
Trata-se de um movimento cívico, apartidário e aconfessional, que integra cidadãos pertencentes a diferentes meios sociais, profissionais, políticos e religiosos que, em nome das suas próprias convicções, mas certamente porque também entendem que os grandes princípios e valores fundacionais da sociedade não são referendáveis nem podem ser matéria exclusiva e íntima da pura consciência individual, se manifestam publicamente contra esta pretensão do Estado português e para, nessa tomada de posição pública, ajudarem a criar uma maior consciencialização da parte de todos para aquilo que realmente está em questão nesta matéria do referendo.
É preciso dizer, à partida, que esta nova consulta ao povo português para a despenalização do aborto é um acto que decorre da mais descarada agenda política deste governo, que precisa, salvo seja, passar a mão pelo pêlo da esquerda partidária e parlamentar, assim apaziguando e criando um intervalo politicamente correcto face à onda crítica que em 2007 vai massacrar muito mais duramente a crista do governo. Evidentemente, no estado em que está o país e com os problemas sociais e económicos que berram cada vez mais alto na praça pública e nos jornais, vir fazer do debate e referendo sobre o aborto a grande prioridade nacional deste princípio de ano novo, não pode ser sério. Daí que fosse interessante saber, no caso de, por hipótese, o NÃO ganhar, quantas vezes mais vai o referendo ser artificiosamente suscitado…
O aborto já se encontra legalizado em Portugal desde 1984, tendo a lei sofrido alterações posteriores: desde 1997 que a lei define muito claramente um conjunto de condições e de prazos pelos quais, se verificados e cumpridos, a mulher pode abortar, em hospitais públicos ou clínicas privadas, com serviços pagos pelos impostos de todos nós e sem ter que dar outras explicações acrescidas. Desde o referendo de 1998 nada se alterou de substancial, a não ser o aumento da informação e dos meios anticonceptivos postos à disposição pela indústria farmacêutica, e que só não são mais utilizados numa prevenção correcta da gravidez indesejada, sobretudo pela juventude, porque o Estado e os paladinos do “sim”, com os agentes políticos à cabeça, nunca mostraram o devido empenhamento em dinamizar estratégias de (in)formação responsável junto dos jovens e da população em geral, que era o que deveriam fazer a sério para serem eticamente consequentes com a sua gritaria – essa, sim, bastas vezes hipócrita! – contra o aborto clandestino. O qual não vai, naturalmente, diminuir: está mais que provado, até pela estatística dos países “avançados” (dos quais, entre nós e como bons terceiro-mundistas, muitos reclamam o “exemplo”), que a liberalização do aborto – que é o que é, na realidade, a pretendida despenalização – contribuiu para um aumento generalizado da prática abortiva, sem que fizesse diminuir o aborto clandestino e, ainda pior, sem resolver qualquer dos problemas sociais e económicos que estão na sua origem (obviamente, quem quer esconder a gravidez ou fazê-la desaparecer sem deixar rasto, não vai bater ao hospital público; e as “condições de produção”, tanto da gravidez indesejada como da clandestinidade abortiva, não se eliminam por decreto da República).
É preciso, por conseguinte, fazer o retorno quer às origens reais do problema, quer à radicalidade e universalidade dos princípios, para sustentar sobre a matéria do aborto um discurso responsável, capaz de operar mediações viáveis entre o que poderíamos chamar uma pragmática da compreensão do humano e a não disponibilização casuística e relativista de uma ética responsável da Vida e da Pessoa.
Assim, há um dado que é tão incontornável que se auto-institui em ponto de partida e de chegada de qualquer moral: a Vida, toda a vida humana, constitui por si uma afirmação e um direito que não pode ser referendável, pois é a base e a fonte de todos os outros direitos. O direito à vida é, nas palavras de João Paulo II, “uma evidência moral e o primeiro critério de justiça social”. Fazer tábua rasa deste princípio, como se verifica com cada vez maior frequência por parte dos predadores pós-modernos e tão politicamente correctos que têm acesso às tribunas mediáticas, desvaloriza de maneira irreversível a dignidade da pessoa humana, converte-a em coisa disponível para ser gerida pela ética de ocasião ou pela garra do mais forte, e contribui de modo dramático e, quem sabe, irreversível, para o declínio social e civilizacional. Evidentemente que o alarido abortista que na última década se faz ouvir em Portugal, tem a ver com todo um ambiente cultural e moral de pulverização de valores e de referências fundacionais, num crescendo de absolutização do efémero, do concreto e do quotidiano, tomados mediaticamente como “exemplares”, fonte explicativa e normativa para as pobres vidas – milhões delas! – que vão suando a sobrevivência de cada dia, agora reconfortadas pela religião do consumo e pela promessa, ilusória e vã, de “amanhãs” que nunca chegam…
O aborto é uma questão de grande complexidade, que exige ser abordada com sensibilidade e discernimento. Raciocínios simplistas e posições fundamentalistas, de um lado ou do outro, não fazem falta e só obscurecem o debate. As diferentes questões suscitadas pela pergunta a referendar, clamam por um esclarecimento veraz, capaz de articular a realidade e os princípios. Sabendo-se, à partida, que os paladinos do discurso pró-aborto não hesitam em usar falsas evidências e argumentos sem provas (por exemplo: o embrião não é vida humana, pelo que o feto não tem direitos; a mulher tem direito a usar o seu corpo e o aborto é um direito muito dela; se acabar o aborto clandestino, as mulheres ficam mais protegidas, além de que não vão para a cadeia; o aborto é uma questão de saúde pública, logo o Estado deve pagar; etc., etc.), jogando com sofismas e falácias, numa urdidura que é sobretudo ideológica e política e que, não poucas vezes, roça a intolerância…
Possa o tempo disponível até ao referendo contribuir para tornar os cidadãos mais conscientes das questões que estão em jogo na problemática do aborto a pedido: há que saber se é séria e se pode ser levada a sério uma sociedade e um Estado que se outorgam a licença de matar.
Trata-se de um movimento cívico, apartidário e aconfessional, que integra cidadãos pertencentes a diferentes meios sociais, profissionais, políticos e religiosos que, em nome das suas próprias convicções, mas certamente porque também entendem que os grandes princípios e valores fundacionais da sociedade não são referendáveis nem podem ser matéria exclusiva e íntima da pura consciência individual, se manifestam publicamente contra esta pretensão do Estado português e para, nessa tomada de posição pública, ajudarem a criar uma maior consciencialização da parte de todos para aquilo que realmente está em questão nesta matéria do referendo.
É preciso dizer, à partida, que esta nova consulta ao povo português para a despenalização do aborto é um acto que decorre da mais descarada agenda política deste governo, que precisa, salvo seja, passar a mão pelo pêlo da esquerda partidária e parlamentar, assim apaziguando e criando um intervalo politicamente correcto face à onda crítica que em 2007 vai massacrar muito mais duramente a crista do governo. Evidentemente, no estado em que está o país e com os problemas sociais e económicos que berram cada vez mais alto na praça pública e nos jornais, vir fazer do debate e referendo sobre o aborto a grande prioridade nacional deste princípio de ano novo, não pode ser sério. Daí que fosse interessante saber, no caso de, por hipótese, o NÃO ganhar, quantas vezes mais vai o referendo ser artificiosamente suscitado…
O aborto já se encontra legalizado em Portugal desde 1984, tendo a lei sofrido alterações posteriores: desde 1997 que a lei define muito claramente um conjunto de condições e de prazos pelos quais, se verificados e cumpridos, a mulher pode abortar, em hospitais públicos ou clínicas privadas, com serviços pagos pelos impostos de todos nós e sem ter que dar outras explicações acrescidas. Desde o referendo de 1998 nada se alterou de substancial, a não ser o aumento da informação e dos meios anticonceptivos postos à disposição pela indústria farmacêutica, e que só não são mais utilizados numa prevenção correcta da gravidez indesejada, sobretudo pela juventude, porque o Estado e os paladinos do “sim”, com os agentes políticos à cabeça, nunca mostraram o devido empenhamento em dinamizar estratégias de (in)formação responsável junto dos jovens e da população em geral, que era o que deveriam fazer a sério para serem eticamente consequentes com a sua gritaria – essa, sim, bastas vezes hipócrita! – contra o aborto clandestino. O qual não vai, naturalmente, diminuir: está mais que provado, até pela estatística dos países “avançados” (dos quais, entre nós e como bons terceiro-mundistas, muitos reclamam o “exemplo”), que a liberalização do aborto – que é o que é, na realidade, a pretendida despenalização – contribuiu para um aumento generalizado da prática abortiva, sem que fizesse diminuir o aborto clandestino e, ainda pior, sem resolver qualquer dos problemas sociais e económicos que estão na sua origem (obviamente, quem quer esconder a gravidez ou fazê-la desaparecer sem deixar rasto, não vai bater ao hospital público; e as “condições de produção”, tanto da gravidez indesejada como da clandestinidade abortiva, não se eliminam por decreto da República).
É preciso, por conseguinte, fazer o retorno quer às origens reais do problema, quer à radicalidade e universalidade dos princípios, para sustentar sobre a matéria do aborto um discurso responsável, capaz de operar mediações viáveis entre o que poderíamos chamar uma pragmática da compreensão do humano e a não disponibilização casuística e relativista de uma ética responsável da Vida e da Pessoa.
Assim, há um dado que é tão incontornável que se auto-institui em ponto de partida e de chegada de qualquer moral: a Vida, toda a vida humana, constitui por si uma afirmação e um direito que não pode ser referendável, pois é a base e a fonte de todos os outros direitos. O direito à vida é, nas palavras de João Paulo II, “uma evidência moral e o primeiro critério de justiça social”. Fazer tábua rasa deste princípio, como se verifica com cada vez maior frequência por parte dos predadores pós-modernos e tão politicamente correctos que têm acesso às tribunas mediáticas, desvaloriza de maneira irreversível a dignidade da pessoa humana, converte-a em coisa disponível para ser gerida pela ética de ocasião ou pela garra do mais forte, e contribui de modo dramático e, quem sabe, irreversível, para o declínio social e civilizacional. Evidentemente que o alarido abortista que na última década se faz ouvir em Portugal, tem a ver com todo um ambiente cultural e moral de pulverização de valores e de referências fundacionais, num crescendo de absolutização do efémero, do concreto e do quotidiano, tomados mediaticamente como “exemplares”, fonte explicativa e normativa para as pobres vidas – milhões delas! – que vão suando a sobrevivência de cada dia, agora reconfortadas pela religião do consumo e pela promessa, ilusória e vã, de “amanhãs” que nunca chegam…
O aborto é uma questão de grande complexidade, que exige ser abordada com sensibilidade e discernimento. Raciocínios simplistas e posições fundamentalistas, de um lado ou do outro, não fazem falta e só obscurecem o debate. As diferentes questões suscitadas pela pergunta a referendar, clamam por um esclarecimento veraz, capaz de articular a realidade e os princípios. Sabendo-se, à partida, que os paladinos do discurso pró-aborto não hesitam em usar falsas evidências e argumentos sem provas (por exemplo: o embrião não é vida humana, pelo que o feto não tem direitos; a mulher tem direito a usar o seu corpo e o aborto é um direito muito dela; se acabar o aborto clandestino, as mulheres ficam mais protegidas, além de que não vão para a cadeia; o aborto é uma questão de saúde pública, logo o Estado deve pagar; etc., etc.), jogando com sofismas e falácias, numa urdidura que é sobretudo ideológica e política e que, não poucas vezes, roça a intolerância…
Possa o tempo disponível até ao referendo contribuir para tornar os cidadãos mais conscientes das questões que estão em jogo na problemática do aborto a pedido: há que saber se é séria e se pode ser levada a sério uma sociedade e um Estado que se outorgam a licença de matar.
João Henrique Silva
(JM OPINIÃO 4 JAN. 07)
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